*consultar introdução e contexto destas 11 dicas na primeira dica, aqui.
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Dica nº 11 – Demonstra respeito e empatia, aplica o Igual Valor
Chegámos ao fim das 11 dicas que ao longo destas semanas vos vim propondo, enquanto novo olhar e abordagem aos comportamentos indesejados das crianças. Daquelas crianças que nos desafiam mais, as “mal-comportadas”, “terríveis”, essas coisas todas. Aqueles filhos que nos “dão cabo da cabeça”…
Nesta última dica, que tem a ver com demonstrar respeito e empatia na educação das crianças, a proposta geral é que comecemos finalmente a olhar a criança como um ser humano, que merece tanto respeito e consideração, quanto cada um de nós. Sim, é um ser humano ainda imaturo, em desenvolvimento, e por isso mesmo necessita de adultos que o guiem, orientem, e contenham. E que ao mesmo tempo lhe dêem espaço para crescer, liberdade para explorar, providenciem acolhimento ao seu SER.
Infelizmente, condicionados pelas nossas próprias educações e crenças limitadoras, damos por nós a utilizar frequentemente uma formulação de ideias pouco eficaz para os resultados que queremos alcançar enquanto pais. Um exemplo clássico é a humilhação. Vezes demais humilhamos e inferiorizamos as crianças sem nos dar conta. Apenas alguns exemplos:
- xii, que lento, se fosse a tua irmã já tinha acabado…
- ai que porquinho, credo nem lavaste a cara….
- pareces um bebé com essa chupeta e a chorar…
- sabes lá tu o que queres, olha come o que tens aí e pronto.
- que mal educado, achas que alguém gosta quando fazes isso?
Quando estudei com a Mikaela Öven, aprendi sobre um importante valor da Parentalidade Consciente que é o IGUAL VALOR.
Eu já tinha percebido que não era pela via da desconsideração, que lá ia com o meu filho, mas não sabia ainda como fazê-lo de outra forma. Ele é uma criança cheia de vontades. Eu, a adulta cheia de responsabilidades. E como ia ser para aplicar limites? Como gerir os ímpetos do meu filho sem ele sentir a sua integridade ferida? Com a perspetiva do Igual Valor, tudo fez mais sentido.
Igual Valor
É a ideia de que todos os seres humanos têm o mesmo valor intrínseco. Logo, todos os seus sonhos, esperanças, desejos, medos – têm o mesmo valor. Não é uma ideia de igualdade em que somos todos iguais – não – é antes perceber que numa relação (pais e filhos, ou conjugal por exemplo) todos deveremos ver as nossas emoções, necessidades, opiniões, respeitadas de igual forma. Sendo que numa relação de parentalidade, os adultos têm mais responsabilidade e por isso o dever de tomar certas decisões.
Ou seja não significa que o seu filho vai ter o que quer, significa que o adulto vai demonstrar respeito pelo desejo ou sentimento da criança em determinada situação, e ainda assim agir de acordo com o bom senso.
Veja por exemplo:
- quando o seu filho não quer emprestar um brinquedo
- quando diz que não gosta da avó
- quando se recusa a brincar com a irmã
- quando começa a demonstrar muito as suas opiniões e posições (ex. destino de férias)
- quando descumpre uma regra da casa…
Todas as coisas julgadoras, irónicas, acusatórias e eventualmente humilhantes que podemos dizer. Eu sei que digo muitas coisas dessas aos meus filhos… ainda.. infelizmente. E agir assim como mãe, como pessoa, não é lá muito respeitador, então como pode ele aprender a respeitar?
Acho que o mais difícil aqui é nos ouvirmos a nós próprios a falar. Ouvirmos as pessoas à nossa volta a falar com as crianças. Muitas coisas que dizemos, que parecem totalmente aceitáveis à partida, tornam-se com uma breve análise, contraproducentes. Basta pensarmos: “se fosse eu, gostaria que me respondessem assim?”
Tendo em conta os exemplos anteriores, será comum ouvir algo do género:
- Vá lá, não sejas egoísta, empresta lá o camião ao António, até parece que não gostas quando te emprestam os brinquedos a ti, olha que assim os meninos não querem ser teus amigos.
- Ah, Afonso, não se diz isso, a avó é tão tua amiga… olha, ontem gostaste quando ela te deu um chocolate…. Não podes ser interesseiro.. Temos de ser amigos dos avós, não te quero ouvir dizer essas coisas.
- Não és nada compreensivo, poças filho, coitadinha da tua mana, ela quer brincar contigo, gosta tanto de ti, faz tudo por ti, e tu nem és capaz de jogar esse jogo com ela! Que mau irmão!
- Pensas que é como tu queres? Nós é que mandamos aqui e não interessa a tua opinião porque somos nós que pagamos as contas. Portanto, nas férias, vamos visitar os tios à Alemanha e pronto.
- Não consegues cumprir nada, és um irresponsável. Não se pode confiar em ti, és sempre a mesma coisa!
Todas estas coisas ditas com a melhor das intenções podem ser bastante mal interpretadas, pelas ideias que têm subjacentes – tendo um efeito muito contrário ao que desejamos como pais. Por exemplo, na situação de emprestar o brinquedo – ao querer que o meu filho saiba partilhar e ser amigo dos outros, a minha intenção é sem dúvida muito boa. Mas rotular logo de egoísta, e fazer previsões de que o meu filho nunca vai ter amigos… Esse tipo de abordagem não vai contribuir muito para ele desenvolver a tal capacidade de partilhar e ser empático. Afinal, ninguém está a ser empático com a situação dele!!
Se virmos bem, possivelmente estamos tão preocupados que os miúdos sejam funcionais neste mundo e minimamente boas pessoas, que nem nos damos conta da pressão que lhes colocamos. É uma criança. Se calhar tem 4 ou 5 anos. Não lhe apetece emprestar o brinquedo. Se calhar está no seu direito!
Respostas mais conscientes poderiam ser algo do género:
- Não queres emprestar o brinquedo agora, não é? Estás a divertir-te. É justo. Como podemos fazer para que todos os meninos fiquem contentes? Quando acabares de brincar avisa OK, o próximo menino interessado fica na lista de espera 🙂
- Bem, estás mesmo chateado com a avó, neste momento sentes que não gostas nada dela, estou a ver. Queres contar-me o que aconteceu?
- A tua irmãzinha adora-te tanto que quer estar sempre a brincar contigo. Agora mesmo, tu queres o teu sossego pois estás concentrado com o teu jogo. Às vezes pode ser irritante ter uma irmãzinha mais nova… Será que podemos combinar algo que funcione para toda a gente, o que achas? Talvez quando acabes esse jogo possas fazer algo com ela?
- Vejo que tens forte posição sobre o destino das férias. Temos que avaliar bem as nossas necessidades e desejos, porque estou a ver alguns conflitos. Proponho fazermos uma reunião de família, para todos expormos as nossas ideias e preocupações.
- Tiveste problemas em cumprir aquela regra. O que posso fazer para te ajudar a conseguir cumprir? Que consequências temos para este incumprimento?
Não é fácil praticar o Igual Valor mas se começar a modificar o seu discurso nem que seja ligeiramente, vai perceber a mudança na reação do seu filho. E, acredite, vai querer mais disso.
Nunca na história as crianças viram os seus interesses defendidos como agora, e ainda bem! Muita gente fica um pouco chocada ao ouvir que coisas tão banais podem ser deseducativas e prejudiciais para os filhos – como obrigar a vestir um casaco por exemplo, ou dar um simples ralhete… – “afinal, temos de educar as crianças, já nem se pode dizer nada, agora…“, poderão dizer. Mas a verdade é que os estudos e evoluções das ciências comportamentais mostram claramente que uma comunicação mais respeitadora e consciente faz maravilhas pela relação que temos com os nossos filhos – e, logo, maravilhas pelo seu comportamento, que depois melhora naturalmente!
Eu acho que isto é muito difícil para todos nós, porque fomos educados a outra luz, noutro tempo, noutro contexto. Que nos disse toda a vida que isso é a forma normal e certa de educar. E agora com estas coisas da Parentalidade Consciente tenho de me colocar em causa… e questionar-me de muitas coisas na forma como falo, nas coisas que digo… Sim, tenho de repensar as minhas ações como mãe. Procurar melhorar a minha comunicação de forma a promover mais saúde emocional e mental nos meus filhos.
E esse questionamento é muito difícil, doloroso por vezes. Mas tão necessário!
Olhe para os seus filhos, aceite as suas posições – não quer dizer que lhes vá fazer a vontade! Está tudo bem, apenas relaxe e aceite que eles não vão querer tudo, fazer tudo, comer tudo, ser sempre cordiais, atentos, responsáveis, diligentes.
Neste momento pode estar a dizer a si própria, “ah mas eu aceito as opiniões e desejos do meu filho”. Nesse caso sugiro que pense melhor. Raros de nós hoje em dia não colocamos nas crianças expectativas a mais, pressão a mais, condicionamento a mais, escuta atenta a menos. Sem julgar, atenção, pois eu faço igual, claro. Aqui o convite é claramente à auto-reflexão, à auto-análise.
E se já é um pai ou mãe que pratica o Igual Valor de forma consistente, então muitos parabéns! Ficamos curiosos por saber das suas experiências, aqui abaixo nos comentários 🙂
Até já!