Agora Que Já Passou…

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agora que já passou

Eu até posso ficar com fama de ser do contra, de nunca alinhar com nada, de estar sempre na oposição… de certo modo, não me importo com esse rótulo, pois acho que a sociedade em geral está… mal. Muito mal. Em muitos aspetos temos tanto a aprender (e sim, isto é uma generalização). E por isso, ainda bem que penso diferente.

É que não posso mesmo ficar indiferente, agora que tenho filhos no ensino público, a esta palhaçada do Carnaval (pun intended).

Em especial nos mais pequenitos, o que observo, é que acaba por ser apenas uma extensão da cultura do show off que se tornou a educação de infância (generalizando, não se esqueçam!!!). Esta cultura inegavelmente presente, dos trabalhinhos todos iguais e muito bonitos, afinal feitos quase integralmente pelas educadoras… Afinal qual a envolvência das crianças, qual a sua participação? Quais as suas aprendizagens? Lindos trabalhos que depois vamos a ver, a criança apenas lhe pegaram num dedo e espetaram na tinta e depois no trabalhinho, e depois mostram orgulhosamente aos pais e queixam-se que ser educadora dá tanto trabalho. Recortes, pinturas e colagens demasiado perfeitas para ser feitas por crianças de 3 e 4 anos… desconfiem, minha gente!!

Então o Carnaval, que é uma ocasião de tanta folia, brincadeira e faz de conta (como de resto o é a infância em si, não?) tornou-se um momento em que os adultos escolhem um “tema”, fazem fatos, e fazem as crianças desfilar nos ditos fatos. Tenho visto coisas surpreendentes! Crianças vestidas de caixote do lixo, vestidas de oceano, vestidas de ervilha, e mais exemplos que apaguei da minha memória! Mas que criança é que opta por se vestir de contentor da reciclagem? Ou de sardinha? Em fatos desconfortáveis e que deram um trabalhão, aos professores e/ou aos pais, apenas para ser vestidos durante um par de horas… Esta coisa dos “temas” tornou-se quase uma ditadura! E se às vezes até podem ser temas mais abertos e que dão origem a experiências de facto divertidas para os miúdos, na maioria das vezes tenho visto temas muito politicamente corretos (ambiente, profissões, oceanos…) mas que depois a envolvência, a aprendizagem efetiva dos miúdos… é quase zero…

Entristece-me que os adultos tenham tomado conta do Carnaval!

Aqui em casa, como aposto que na vossa, vestir disfarces é um favorito para a brincadeira, e temos coleccionado fatos e objetos velhos e variados que colocamos numa grande caixa para quando querem brincar aos disfarces. No Carnaval, apenas vamos a essa caixa e cada um escolhe o que quer. Ao longo do ano, quando calha, podemos arranjar novos disfarces, ou ir juntando peças ao caixote. Assim no Carnaval nunca me costumo preocupar muito. Aliás, o meu filho há 3 anos que apenas se quer vestir de dinossauro, ele ama dinossauros!

Este ano na escola dos meus filhos o “tema” foi as profissões. Felizmente que a educadora da sala deles (andam os dois na mesma sala de JI) tem o bom senso de não incutir aos miúdos o que vestir, e desvaloriza as atividades “em rebanho”. Disse-nos desde o início que cada um fosse como queria. Maravilhoso! Eu cá, dispensava, e estava preparada para passar o dia do desfile da escola com eles, em modo gazeta, mas os dois pequenos quiseram ir participar. Mas claro, vestidos à sua vontade. Então o Pedro foi de dinossauro e a Inês que queria ir de princesa, à última hora achou no caixote um fato de lobo e foi isso que quis vestir. Então e eu havia de ir forçar os meus filhos a vestirem-se de qualquer outra coisa, logo no Carnaval!!!?? Nem pensar. Depressa arranjámos um argumento válido caso fossem confrontados por estarem fora do “tema”, se alguém perguntasse eles eram atores de teatro, ou trabalhadores de um qualquer parque de diversões, e por isso estavam assim vestidos!! Isso também é uma profissão ou não? Ou profissões só pode ser as óbvias da farda: médico, bombeiro, polícia e afins?

Enfim lá foram, lá se divertiram, e está tudo bem! Ou não é essa a intenção do Carnaval?

Ainda ontem ouvi a história da minha sobrinha, que tem um belo fato de Elsa do filme Frozen, que recebeu de presente, e que adora, mas como o “tema” da escola era os planetas, lá teve a minha cunhada de levar um dia inteiro a fazer um fato de planeta em materiais diversos, que a miúda não mais quis usar assim que acabou o desfile, claro!

São estas histórias que me surpreendem, e que me entristecem, porque parece que nos esquecemos qual o objetivo primordial da educação, e nos deixamos levar pelos egos e pela ideia que nós adultos temos sempre que controlar tudo.

Então os professores e escolas queixam-se da burocracia, das tarefas intermináveis, do insuficiente tempo para se dedicarem de facto às crianças, e depois arranjam por iniciativa própria estas coisas, desfiles, temas, festas de natal, performances meio forçadas em muitos dos casos, que criam mais trabalho, mais tarefas… para quê? Para o show off aos pais, aos de fora?

O que será que estas crianças de 3 e 4 anos aprenderam efetivamente sobre reciclagem, planetas ou oceanos? Honestamente, tenho as minhas dúvidas.

Não bastará o admirável trabalho diário enquanto educadores? Não será suficiente no quotidiano fazerem o mais importante, que é guiar a criança, através da sua curiosidade natural, apoiar o seu desenvolvimento, crescimento, compreensão do mundo?

Enfim, não percebo os “temas” impostos, os fatos elaborados (e perdoem-me, mas tantos deles ridículos), acho uma perca de tempo e de recursos. E se perguntarem às crianças, aposto que elas vão concordar.

Agradeço as vossas visões do assunto, exemplos, histórias que contraponham esta minha posição, talvez eu esteja errada e nesse caso gostaria de perceber qual a verdadeira vantagem desta tendência que vejo hoje nas escolas, a cada efeméride que passa.

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