Não é só um jogo! Miniguia sobre videojogos para pais

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É raro haver uma criança que não goste de videojogos, tablets, consolas e afins. Muitos adultos também gostam 😉. Por vezes, nos dias que correm, a exposição prolongada e o aumento do vício preocupam muitos pais, que vêm os filhos completamente absorvidos pelo mundo dos jogos virtuais. De facto existem alguns perigos que convém estarmos atentos. Não só o tempo de exposição e sinais de alerta de uso abusivo, como os conteúdos consumidos. Não podemos nem devemos estar alheios a este mundo, já que ele veio para ficar. E se não conseguimos afastar os nossos filhos dos écrãs, mais vale olhar a situação, conhecer melhor esse mundo, obter informação sobre o que se trata e como podemos melhor lidar com toda esta realidade.

Na semana passada, fim de semana sem crianças, finalmente um serão livre e sossegado, eu e o meu marido pensámos: “Vamos ver um filme”. No entanto, deu-se aquele clássico de já estarmos há meia hora à procura e não chegando a um consenso, reparámos num documentário chamado “Not a Game” na Netflix. Vendo que era sobre videojogos resolvemos assistir, pois é sempre um “tema” cá em casa 🙄. Valeu muito a pena e fiquei com vontade de partilhar algumas coisas que absorvi do documentário, pois pode ajudar muitos pais a lidar com estes problemas.

O Jogo

Convém começar por lembrar que o jogo e o lúdico são parte do comportamento natural humano, com especial destaque na infância e crescimento como forma de adquirir aprendizagens e explorar o mundo. O jogo existiu e existe em todas as épocas e é universal. Antes da revolução tecnológica obviamente os tipos de jogos eram diferentes e a a forma de brincar também. “No meu tempo”, dirão vocês, “tinha de esperar sábado de manhã para ver os desenhos animados e brincar era na rua com os meus amigos.” Pois, também eu. Mas estamos perante esta realidade inegável da tal revolução tecnológica e temos 2 opções: ficar em resistência, ou entrar nesse barco e fazer tudo isto atuar a nosso favor.

“Pelo jogo, com efeito, podemos abandonar o mundo das nossas necessidades e das nossas técnicas, este mundo egoísta que nos cerca e nos sufoca; escapamos à sugestão da violência exterior, ao peso da carne, para criarmos mundos de utopia.” Chateau (1975)

A criação dos primeiros jogos virtuais remonta aos anos 50, foi uma indústria que viu rápida expansão e em poucas décadas todas as famílias tinham uma consola ou PC em casa. Esta transformação veio alterar as dinâmicas sociais, os tempos e locais de jogo, a forma como as pessoas se relacionam com o jogo e entre elas. É preciso dar atenção a estas dinâmicas para que não nos deixemos enredar nos possíveis perigos e sim integrar estes dispositivos nas nossas vidas de forma o mais saudável possível.

Uma das coisas que nos assusta é uma reação muito agressiva das crianças quando é hora de desligar. Pode ser um indicador de que o uso está a ser mal gerido. Sinal também de que é preciso trabalhar a educação emocional, lidar com a frustração. E claro, limites claros, combinados, acordos. Tudo isto pode ajudar a que a hora de desligar seja mais tranquila. Quando observamos esse comportamento recorrente é sem dúvida hora de repensar os hábitos instalados e assumir responsabilidade, porque os videojogos podem ser ótimos e também podem ser muito perigosos.

Videojogos

Os videojogos satisfazem as nossas necessidades

Não há como negar que muitos, muitos jovens apresentam uma grande paixão por videojogos. É fácil entender, já que é uma atividade atrativa, cativante, que oferece senso de controlo e segurança, porque por mais que seja um jogo de suspense ou luta, por exemplo, estás sempre seguro atrás do ecrã. Quando quiseres desligas. Através do jogo as crianças e jovens conectam-se com outras pessoas e criam comunidades, o que é muito interessante para eles. Os jogos oferecem experiências estimulantes, diversidade de cenários e de ambientes, isso é muito atrativo para o cérebro dos jovens também. Ainda mais quando não o podes viver na vida real (porque, pandemia). E ainda, dado que cada vez há mais jovens a investir imenso tempo a melhorar as suas habilidades de jogo, podem ainda sentir-se reconhecidos dentro daquele meio, pelo seu desempenho e contributo – sentem-se valorizados e apreciados.

Manter as crianças seguras também online

Uma parte do documentário que me tocou particularmente foi quando questionam um grupo de crianças sobre como os pais as protegem. “Coloca-me o cinto para andar de carro.”, “Dá-me a mão para atravessar a estrada”, “Ajuda-me com as aranhas”, foram algumas das respostas. Quando se questionou como é que os pais as protegiam online, as amorosas crianças ficaram em silêncio a pensar. “Não sei!”.

De facto a maioria de nós, pais, ainda tomamos poucas medidas de segurança no mundo virtual, o que tem de ser revisto com urgência. Vigiar conteúdos, estar atento, ter softwares de proteção, modo criança, sites bloqueados, e por aí fora. Honestamente eu própria tenho de melhorar esta parte e não sou a pessoa mais entendida. Existem muitos especialistas em segurança na internet. Numa pesquisa descobri o site da SeguraNet – Navegar em Segurança, que me parece interessante, vou sem dúvida explorar. Fica a sugestão.

É que os perigos são mesmo reais. Cada dispositivo ligado à internet é um potencial enorme para milhentas situações e muitas delas podem ser menos boas, como exposição privada inadequada, conteúdos impróprios, cyberbullying, para não falar de coisas mais graves ainda. Neste artigo aqui do blog, por exemplo, falei sobre a selva que pode ser a internet.

Videojogos e violência

Normalmente não gostamos que os nossos filhos joguem jogos violentos, leia-se de tiros, de matar e por aí fora. Existe uma forte associação popular entre os jogos e a violência. Os investigadores e especialistas que falaram no documentário mostraram outra versão, para mim muito interessante: Quem joga torna-se violento, OU Quem é violento joga estes jogos? Não há uma correlação direta entre jogar determinados tipos de jogos e atitudes particularmente violentas no futuro. AGORA, não estamos a dizer que os videojogos não causam violência, a questão é que causam tanto como causa a TV, os filmes, séries, youtubers, e até a política!

Para mim este twist foi muito interessante de entender. Porque significa que se houver um fundo equilibrado, não é jogar certos jogos que vai transformar os nossos filhos em potenciais assassinos. Todos conhecemos irmãos, primos, amigos, que levaram a adolescência a jogar todo o tipo de jogos violentos e continuam a ser uns porreiros, certo?

Videojogos

O outro lado

Dito o anterior, pensemos agora o seguinte: hoje em dia há imensos jovens a fazer vida profissional dos jogos virtuais, existem equipas como no futebol, que, já agora, enchem estádios, para vossa informação, caso não soubessem como eu 🙄. Existe toda uma indústria que emprega pessoas dos mais variados ramos, não só os jogadores em si, como criadores de jogos, músicos, designers, publicitários, engenheiros, comentadores, treinadores, para nem falar dos criadores de conteúdo e influenciadores digitais.

Se calhar, se o nosso filho está convicto que “o que quer ser quando for grande” tem a ver com o mundo dos jogos, isso pode não ser uma coisa assim tão absurda. Afinal, se os incentivamos e compramos equipamentos para o futebol ou as aulas de guitarra, porque não haveremos de apoiar a paixão pelos videojogos de igual forma?

Além disso podemos deixar de diabolizar os videojogos. Afinal eles apresentam um potencial enorme, estimulam imensas competências cognitivas, e abrem um mundo de possibilidades para melhorar a vida das pessoas. O documentário dá imensos exemplos: atletas que tiveram uma lesão e viram nos videojogos uma outra maneira de explorar aquela paixão, crianças doentes em que os jogos os ajudam a superar períodos complicados ou mesmo os acompanham numa vida de hospital em hospital. Pessoas com deficiências várias que obtêm nos jogos oportunidades de inclusão que não têm no mundo real. Oportunidades para pessoas idosas com falta de mobilidade e perda dos recursos físicos. São imensas as possibilidades.

Afinal, quando me devo preocupar?

Muito vamos discernir com o nosso bom senso: o jogo é utilizado de forma minimamente saudável? Ou sentimos que perdemos o controlo? Que a criança ou jovem perdeu o controlo sobre o jogo? Joga para se divertir ou está escondido atrás do jogo? É um sinal de alarme forte quando já não há diálogo, quando o jovem deixa de fazer outras coisas, quando se torna uma compulsão. Não se trata tanto da quantidade de horas, mais da relação com o jogo. Por exemplo, esses atletas de e-sports (competições de jogos eletrónicos) tal como os outros atletas, quem joga profissionalmente dedica muito tempo ao treino e passa horas infindáveis no computador. No entanto é acompanhado por treinadores, coaches, colegas. Há interação, não está isolado num quarto 10 horas por dia a jogar.

Em vez de “Quanto tempo joga?”, podemos perguntar “Porque joga?”. Se o jovem sente que TEM de jogar, que não tem escolha, é mais preocupante. O ideal é jogar porque quer, porque é uma escolha, e está tudo bem se não jogar, e é apenas mais uma das coisas que escolhe para fazer.

Alerta vermelho

O não saber. Quando não sabemos o que joga, quanto tempo joga, com quem joga, onde joga. Como pais devemos estar a par das atividades com que as crianças ocupam o tempo. E os videojogos podem ser uma delas, mas temos que estar informados. E sim, temos que colocar limites! Afinal, somos responsáveis pelos nossos filhos e por garantir ao máximo que têm um desenvolvimento saudável. Tal como não queremos que suba às árvores todo o dia, como não queremos que esteja a ler todo o dia, também não vamos querer que jogue videojogos todo o dia. Lá está, equilíbrio e bom senso. Tendo em conta que o sedentarismo é dos piores problemas do século XXI, como pais devemos garantir que as crianças e jovens estejam ao ar livre, movimentem o corpo e contactem com a natureza. Isto é ESSENCIAL.

Se sentes que tens dificuldades em colocar limites, tens estes artigos no blog sobre isso, aqui e aqui e aqui. Ou podes enviar-me mensagem privada que tenho formas de te ajudar.

Resumindo

É normal termos receio perante uma coisa nova ou que desconhecemos, por isso somos tão resistentes aos videojogos. No geral é um mundo desconhecido para nós, pais. Há que envolver a indústria nesta reeducação das famílias, mas também os governos devem ter ação neste sentido e os próprios pais, que têm o dever de se informar.

É fácil culpar os videojogos, mas a verdade é que somos nós os responsáveis pelos nossos filhos. Cabe-nos a nós virar isto a nosso favor, e para isso podemos e devemos prestar mais atenção, interessarmo-nos pelos jogos que os nossos filhos jogam, ouvir com genuíno interesse aquilo que eles pensam e sentem, as suas opiniões, gostos, visões. Só assim poderemos criar aquela relação em que a criança confia em nós, há comunicação, conta-nos as coisas. Se vivermos a criticar os seus gostos, não vamos a lado nenhum. Mais uma vez não quer dizer que não haja limites. Isso tem de haver. Mas temos de nos aproximar, de entrar um pouco naquele mundo, perceber e entender a sua posição.

E aí em casa? Há preocupação, ou uma relação saudável com os videojogos? Conta-me nos comentários aqui em baixo!

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